Aliger gigas

Aliger gigas

Concha-rainha, Estrombo-rosa, Raínha-das-conchas

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Aliger gigas

Aliger gigas, popularmente conhecida como concha-rainha (BRA), estrombo-rosa ou raínha-das-conchas (POR), é uma espécie muito grande de caramujo marinho comestível, um molusco gastrópode pertencente à famíla Strombidae. Trata-se de um dos maiores gastrópodes da porção oeste da zona do Atlântico Tropical, cuja distribuição se estende de Bermudas ao Brasil. Nos diversos países onde ocorre, é também conhecido por outros nomes populares, como caracol rosado, cobo, botuto, guarura, e lambi; recebendo, em inglês, as denominações de queen conch ou pink conch.

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Este grande gastrópode herbívoro vive em fundo bentônico, em meio a leitos de ervas marinhas, embora seu habitat exato possa variar com os diferentes estágios de seu desenvolvimento. O animal adulto possui uma concha grande e pesada, com uma característica abertura de coloração rosada e um lábio externo bastante expandido, ausente em espécimes juvenis. Sua anatomia externa assemelha-se à de outros caramujos da mesma família; apresenta um focinho longo, dois pedúnculos oculares dotados de tentáculos sensoriais menores, um pé forte e um opérculo córneo, em formato de foice.

Aliger gigas possui alguns comensais, incluindo outros gastrópodes, caranguejos e peixes, e entre os seus parasitas encontram-se os coccídeos. Os predadores da concha-rainha são outros moluscos, estrelas-do-mar, crustáceos e vertebrados (peixes, tartarugas marinhas e humanos). Sua carne é consumida por humanos e empregada em uma miríade de receitas, em pratos que variam desde saladas a porções fritas. A concha, por sua vez, é comercializada como souvenir ou como objeto decorativo. Foi também utilizada por nativos americanos e por antigos povos caribenhos para a fabricação de utensílios.

A concha-rainha está protegida pela Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Silvestres Ameaçadas de Extinção (CITES). Tal espécie ainda não está verdadeiramente ameaçada em todo o Mar do Caribe, mas corre perigo em muitas outras áreas. A ameaça deve-se, em grande parte, à coleta exacerbada deste animal, pois sua carne é uma fonte de alimento importante para os humanos. Os regulamentos da CITES estão voltados para a interrupção da exportação de carne de Aliger gigas nos países caribenhos onde é encontrado, bem como a exploração comercial de sua concha como objeto de decoração. Ambos tipos de comércio eram tão intensos no passado que representavam uma ameaça muito séria à sobrevivência da espécie.

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Aparência

Muitos detalhes da anatomia de Aliger gigas não eram bem conhecidos até 1965, quando o zoólogo americano Colin Little publicou um estudo geral sobre o assunto. Detalhes anatômicos foram recentemente descritos por Simone (2005). Aliger gigas possui um focinho longo e bastante extensível, que contém uma rádula do tipo tenioglossa em seu interior. Dois pedúnculos oculares (também denominados omatóforos) projetam-se de sua base, e cada um deles contém um olho grande e bem desenvolvido com íris amarelada e pupila negra, e também um tentáculo sensorial menor que se origina próximo de sua extremidade anterior. Os olhos de Aliger gigas têm a capacidade de regenerar-se completamente caso a extremidade do pedúnculo seja amputada. Tanto o focinho quanto os pedúnculos oculares apresentam manchas de coloração escura nas áreas comumente expostas. O manto apresenta coloração mais escura na parte anterior, tornado-se mais clara posteriormente. Sua margem frequentemente possui coloração alaranjada, bem como o sifão, que também pode ter uma tonalidade amarelada. Várias estruturas são facilmente distinguíveis externamente quando o animal é removido da concha, como o rim, a glândula nefridial, o pericárdio, as glândulas genitais, o estômago, o saco do estilete e a glândula digestiva.

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Aliger gigas tem um pé grande e forte, de coloração escura na base, tornando-se mais esbranquiçada em direção à massa visceral. A base da extremidade anterior do pé apresenta um sulco distinto, que contém a abertura da glândula pediosa. Afixado à extremidade posterior do pé, por cerca de um terço de seu comprimento, está o opérculo córneo com formato de foice ou garra, de coloração marrom escura, e que possui uma costela central conferindo-lhe um reforço estrutural. A base dos dois terços posteriores do pé do animal é arredondada, e apenas o primeiro terço é aplicado ao substrato durante a locomoção. O músculo columelar tem coloração esbranquiçada, e permanece aderido à columela (o pilar central da concha univalve, ao redor do qual as espiras são constituídas). A contração vigorosa desse músculo permite ao animal retrair-se para o interior da concha, em resposta a estímulos indesejados.

A concha adulta de Aliger gigas tem de 15–31 cm de comprimento, sendo o tamanho máximo já reportado de 35.2 cm. É bastante sólida e pesada, apresentando de nove a dez voltas e um lábio externo bastante desenvolvido e estendido. Uma fenda em forma de "U", presente no lábio externo à direita do canal sifonal da concha de um espécime dextrógiro adulto (denominado "stromboid notch" em inglês, ou "reentrância estromboide" em português), é característica da família Strombidae e facilmente distinguível nesta espécie. No animal vivo, um dos pedúnculos oculares se protrai através dessa fenda.

A espira (porção mais posterior da concha em espiral que compreende todas as voltas, com exceção da última, que é conhecida como volta do corpo) da concha é usualmente mais alta, isto é, alongada do que a de outras espécies da família Strombidae. As extremidades da abertura da concha adulta são coloridas em tons de cor-de-rosa mais ou menos suave, a depender do indivíduo, podendo apresentar também uma coloração mais avermelhada, ou ainda uma tonalidade creme ou amarelada. O perióstraco (camada mais externa da concha, similar a uma película de espessura variável, composta unicamente de material orgânico) é bastante fino, com cor bronze suave.

Diferentemente do que ocorre com os animais adultos, as conchas de indivíduos juvenis têm uma coloração malhada de marrom e branco, e não possuem o lábio externo estendido ou espessado. Na Flórida, os juvenis são conhecidos como rollers ("roladores", em inglês), pois a ação das ondas facilmente os deslocam, fazendo rolar suas conchas. Todavia, é muito difícil que o mesmo se aplique a indivíduos adultos, que são muito maiores, mais pesados e estáveis. O lábio externo da concha tende a se estender e espessar com a idade do animal.

As condições ambientais, como localização geográfica, disponibilidade de alimento e temperatura, e outros fatores externos, como ação de predadores, podem influenciar de maneira considerável a morfologia da concha de Aliger gigas. Os indivíduos juvenis da espécie desenvolvem conchas mais espessas quando expostos à ação de predadores, se comparados a indivíduos não-expostos. Também desenvolvem conchas mais largas e grossas, com espira adornada por espinhos menos protuberantes, conforme aumenta a profundidade em que vivem.

Desenhos da obra Index Testarum Conchyliorum, publicada em 1742 pelo médico e malacólogo italiano Niccolò Gualtieri, e do Manual of Conchology, publicado em 1885 pelo malacólogo americano George Washington Tryon, ilustram a morfologia de conchas em estado adulto e juvenil de Aliger gigas, sob diferentes perspectivas. As ilustrações não-coloridas mostram a vista apical (note a espira alongada, no centro do desenho), ventral (note a fenda dos Strombus próxima ao canal sifonal, no topo do desenho) e dorsal de uma concha completamente desenvolvida. Nessas ilustrações, o lábio externo expandido e espessado com formato alado é marcante. O desenho colorido representa uma concha em estágio juvenil, com seu padrão típico de coloração (note a ausência da expansão do lábio externo na última volta da concha, conferindo um contorno muito mais cônico ao espécime representado):

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Distribuição

Geografia

Aliger gigas é nativo da América do Norte e Central. Vive em bentos da zona tropical caribenha, que inclui: México, sul da Flórida, as Bahamas e Bermuda, ao norte, em profundidades variando de 0,3 m a 18 m. Localidades onde a concha-rainha pode ser encontrada incluem:

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Aruba, nas Ilhas ABC; Barbados; Bimini, Ilha Cat, Eleuthera, Inagua e San Salvador em Bahamas; Belize; Bermuda; Brasil (contestado por alguns autores); Costa Rica, República Dominicana e Panamá; Ilhas Swan em Honduras; Jamaica; Martinica; Alacrán, Campeche, Cayos Arcas e Quintana Roo, no México; Porto Rico; São Bartolomeu; Mustique e Granada, nas Granadinas; Pinar del Río, Havana, Matanzas, Villa Clara, Cienfuegos, Holguín, Santiago de Cuba e Guantanamo, nas Ilhas Turks e Caicos e Cuba; Carolina do Sul, Florida e Flower Garden Banks, Texas, nos Estados Unidos; Carabobo, Falcon, Golfo da Venezuela, Arquipélago de Los Roques, Los Testigos e Sucre, na Venezuela, e St. Croix, nas Ilhas Virgens.

Este grande caramujo vive em prados de ervas marinhas e substrato areno-lodoso, comumente associado a espécies dos gêneros Cymodocea, Thalassia e Syringodium.Indivíduos juvenis são avistados em prados de algas em águas rasas, bastante diferentes daqueles em que normalmente se localizam os adultos. Os habitats utilizados como berçários pelos indivíduos juvenis são definidos por uma série de fatores combinados, características intrínsecas do ambiente e processos ecológicos, que, juntos, proporcionam altas taxas de recrutamento e sobrevivência. Aliger gigas é frequentemente encontrado em agregados distintos que podem conter vários milhares de indivíduos cada. O seu acasalamento, para ter sucesso, precisa ter 50 conchas, ou mais, desovando de uma vez.

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Aliger gigas Mapa do habitat
Aliger gigas Mapa do habitat

Hábitos e estilo de vida

A concha-rainha utiliza um método bastante peculiar para locomover-se. Esta série de manobras intrincada e curiosa foi originalmente descrita pelo zoólogo americano George Howard Parker em 1922. Inicialmente, o animal fixa a extremidade posterior do pé ao substrato, fincando nele o opérculo pontiagudo. Então, estende o pé anteriormente, levantando e projetando a concha adiante no chamado "movimento de salto", muito similar a um saltador com vara. O movimento de salto torna Aliger gigas um bom escalador de superfícies verticais de substrato resistente, e pode auxiliar o animal a inibir seus predadores, impedindo que os traços químicos por ele deixados no substrato sejam rastreados.

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Aliger gigas é dioico e a fertilização ocorre internamente. As fêmeas são normalmente maiores que os machos em populações naturais, e ambos os sexos estão presentes em proporção similar. Após a fertilização, as fêmeas depositam os ovos em cordões gelatinosos que podem alcançar um comprimento aproximado de até 23 m, sobre a areia ou algas. O cordão pode enrolar-se sobre si aglutinando-se, constituindo uma massa de ovos compacta. Cada massa de ovos pode ter sido fertilizada por múltiplos machos, e o número de ovos por massa pode variar bastante, dependendo das condições ambientais, como disponibilidade de alimento ou variações de temperatura. Usualmente, as fêmeas produzem em torno de oito a nove massas de ovos por temporada e cada uma delas pode conter de 180 000 a 460 000 ovos, embora a cifra de até 750 000 ovos possa ser alcançada sob certas condições. As fêmeas de Aliger gigas podem procriar várias vezes por temporada reprodutiva, que dura de março a outubro, com picos de atividade entre julho e setembro. Após a eclosão, as larvas véliger (uma forma larval comum a vários gastrópodes e bivalves marinhos) bilobuladas emergem para passar vários dias desenvolvendo-se em meio ao plancton, alimentando-se primariamente de fitoplâncton. A metamorfose ocorre em cerca de dezesseis a quarenta dias a partir da eclosão, quando a protoconcha (a concha embrionária) está a alcançar uma altura de 1,2 mm. Após a metamorfose, os indivíduos de Aliger gigas passam o restante de suas vidas na zona bentônica, sobre a superfície do sedimento, normalmente permanecendo enterrados durante o primeiro ano de vida.

Aliger gigas atinge a maturidade sexual na idade aproximada de três a quatro anos, com um comprimento de concha de aproximados 180 mm e pesando até 2,27 kg. Corriqueiramente, cada indivíduo pode viver por até sete anos. Em águas profundas, podem viver até vinte ou trinta anos. Estimativas de longevidade, em alguns casos, alcançam quarenta anos. Acredita-se que a taxa de mortalidade tende a ser menor em indivíduos mais velhos, graças a sua concha mais espessa. Estimativas demonstram que a taxa de mortalidade de Aliger gigas diminui em proporção inversa ao tamanho do animal, mas pode variar também com o habitat, e outros fatores.

Diversas espécies de animais são comensais de Aliger gigas, o que significa que ambos os organismos mantêm uma relação onde um indivíduo se beneficia (o comensal) e o outro não obtém qualquer vantagem (neste caso, a concha-rainha). Entre os moluscos, são principalmente as espécies do gênero Crepidula. O crustáceo decápode Porcellana sayana é também um de seus comensais, e um pequeno peixe cardinal, conhecido como peixe-caramujo (Astrapogon stellatus), por vezes aloja-se no manto de Aliger gigas para proteger-se, não trazendo-lhe qualquer benefício aparente. Esta espécie de caramujo é frequentemente parasitada por coccídeos pertencentes ao filo Apicomplexa. Estes microorganismos unicelulares alojam-se inicialmente em células vacuoladas das glândulas digestivas do hospedeiro, onde se reproduzem livremente. A infestação pode então proceder para as células secretoras do mesmo órgão, e o ciclo de vida completo do parasita provavelmente ocorrerá no mesmo hospedeiro e tecido.

Aliger gigas é presa de diversas espécies de moluscos gastrópodes carnívoros, como o múrice-pomo (Murex pomum), o caramujo Turbinella angulata, os caramujos-lua Natica spp. e Polinices spp., o múrice Murex margaritensis, o trompete-de-tritão (Charonia variegata), e o caramujo-tulipa (Fasciolaria tulipa). Vários crustáceos são predadores conhecidos da concha-rainha, como o siri-azul (Callinectes sapidus), o caranguejo Calappa gallus, o ermitão Petrochirus diogenes, a lagosta Panulirus argus, e muitas outras espécies. Aliger gigas é também presa de equinodermos, como a estrela-do-mar Oreaster reticulatus, e de vários vertebrados, incluindo peixes como o Trachinotus falcatus e o baiacu Diodon hystrix, as tartarugas marinhas Caretta caretta e os humanos.

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Dieta e nutrição

Os gastrópodes estrombídeos foram amplamente aceitos como carnívoros por diversos autores no século XIX, conceito que perdurou até a primeira metade do século XX. Essa ideia errônea originou-se nos escritos de Jean-Baptiste Lamarck, que agrupou os estrombídeos com outros caracóis supostamente carnívoros. Esta ideia foi posteriormente repetida por outros autores, mas não foi apoiada por observações. Estudos subsequentes refutaram o conceito equivocado, provando sem dúvida que os gastrópodes estrombídeos são animais herbívoros. A concha-rainha é um animal herbívoro como os demais Strombidae, alimentando-se de ervas marinhas, macroalgas (incluindo a espécie Sphaerococcus confervoides), e ocasionalmente detritos. A macroalga verde Batophora oerstedii é notavelmente um de seus alimentos prediletos.

População

Conservação

Apenas as conchas-rainha sexualmente maduras são capazes de reproduzir-se, mas há quase a mesma quantia de carne em um indivíduo juvenil grande, quando comparado a um adulto. Em locais onde os adultos se tornaram raros, animais juvenis e subadultos são frequentemente coletados por pescadores antes de terem tido a chance de reproduzir-se. Em várias ilhas caribenhas, as conchas-rainha subadultas constituem a maior parte do pescado.A abundância da concha-rainha tem declinado com o passar dos anos, como resultado de pescaria exacerbada e caça. As populações da espécie em Honduras, no Haiti e na República Dominicana, em particular, estão sendo exploradas em quantidades que podem ser não-sustentáveis (sobrepesca), e o comércio em vários países do Mar do Caribe é tido como provavelmente ou certamente não-sustentável. A pesca ilegal de Aliger gigas, sobretudo em águas estrangeiras e subsequente comércio ilegal internacional, é um problema amplo e comum na região. A International Queen Conch Initiative (Iniciativa Internacional da concha-rainha, em inglês) é uma tentativa de organizar a pescaria desta espécie, e tem um sítio eletrônico próprio.

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Aliger gigas é mencionado na CITES desde 1985 e está no seu Apêndice II desde 1992, por conta do contínuo declínio de suas populações e, portanto, sua comercialização é estritamente regulamentada. Nos Estados Unidos, toda a pesca de conchas-rainha é proibida na Flórida e águas federais adjacentes. Não existe qualquer organização internacional de manejo da pesca dessa espécie no Mar do Caribe. Todavia, em Porto Rico e nas Ilhas Virgens, a concha-rainha está regulamentada sob os auspícios do Conselho Caribenho de Manejo da Pesca (CFMC).

Em 1990, a Convenção para a Proteção e Desenvolvimento do Ambiente Marinho da Região do Caribe (Convenção de Cartagena) incluiu a concha-rainha no Anexo II de seu Protocolo Sobre Áreas Especialmente Protegidas e Vida Selvagem (protocolo SPAW) como uma espécie que pode ser utilizada racionalmente e de modo sustentável, e que requer medidas de proteção. Isto levou os norte-americanos a proporem a adição desta espécie no Apêndice II da CITES em 1992, e Aliger gigas tornou-se o primeiro produto de pescaria de larga escala a ser regulamentado pela CITES. Desde 1995, a CITES tem revisado o status biológico e comercial da concha-rainha através de seu sistema de Revisão de Comércio Significativo (Significant Trade Review, em inglês). Este sistema é utilizado quando existe preocupação quanto aos níveis de comércio de espécies presentes no Apêndice II. Baseado na revisão de 2003, a CITES recomendou que todos os países proibissem a importação da concha-rainha de Honduras, Haiti e da República Dominicana (veja Standing Committee Recommendations da CITES). Aliger gigas continua disponível em outros países caribenhos, incluindo Jamaica e as ilhas Turcas e Caicos, que possuem um eficiente manejo de sua pescaria.

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Referências

1. Aliger gigas artigo na Wikipédia - https://pt.wikipedia.org/wiki/Aliger_gigas

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